E na abadia de thelema...
‘’ A ressurreição do corpo não precisa ser adiada para após
a morte. Ela pode acontecer a qualquer momento, se quiseres. Vocês são gigantes
que foram conduzidos por pigmeus,acordem de seu sono profundo...’’
‘’E eu sou Éris. Eu lhes trago o caos...’’
Eis a morte dos ventos,o azedume na saliva, o amargor na
língua costurada...
O olho de vidro rola pelo salão...
A mulher velha procura por seu olho que caiu no chão . Ela o
tirou para que o ornitorrinco anão pudesse ejacular dentro de sua cavidade
ocular...
A velha sorri,a porra amarela escorre da órbita de seu olho
direito...
A lontra aracnídea grita no teto do salão, como se fosse
desabar em prantos
O banquete é servido, numa bela mesa apoiada por quatro
pessoas nuas ,pintadas de ouro, depiladas e sem sobrancelhas.
É servido um prato de pele assada,com salada de cabelos,
vinho de banha humana e unhas
esverdeadas cozidas na urina de cachorro. Para a sobremesa,feto de galinha com
olhos de abutre,adocicado com lágrimas das virgens anãs do paraíso libertino...
Jodoraw olha para cima e vê algumas figuras conhecidas por
ele. Ali estavam o viajante,o terapeuta maldito com a cauda do escorpião negro,
o garoto sem mandíbula e a menina dos olhos de vidro,o poeta
terrorista,lúcifer,azrael ,kali,cresus jisto e o grande ego. Todos olhavam pra
ele e sorriam, como se estivessem esperando por algo. Éris estava iluminada,em sua esplendorosa
forma de pinha dourada. Uma vibração fantástica emanava de seu ser,como numa
sinfonia insana...
Jodoraw sabia que
aquelas criaturas lhes eram familiares...
Aquele lugar era belo e sombrio , um pesadelo surreal. O som
que aquele local emitia era ensurdecedor, o cheiro era de carne apodrecida ,
mesclando com cravo e alecrim. Ele queria voltar para sua vida, deveria voltar
pelo espelho que o trouxe até ali. A deusa Éris cantava uma bela canção,
fazendo o centro da cabeça de Jodoraw vibrar intensamente, algo havia
despertado ali dentro. Talvez fosse sua alma,ou algum ser superior que existis
dentro de seu cérebro, que fora dominado pelo cárcere do medo,da angústia,do
pavor,da covardia e do ódio , tudo muito bem banhado e moldado com lágrimas e barro estomacal.
No meio daquele turbilhão de emoções, Jodoraw sentia que seu
corpo poderia explodir,algo muito grande estava ocorrendo no núcleo de sua
existência. Quando seus olhos se viraram para o lado esquerdo de seu corpo, uma
janela para o outro lado estava aberta,era uma nova passagem,um novo espelho à
sua espera. E mais uma vez chovia, uma imensa tempestade de carne moída e
sangue , caindo das entranhas daquele céu negro e avermelhado.
Em thelema, Éris havia se transformado em uma enorme vagina
dourada,pulsante,de onde saia um doce aroma de vida e paixão. Jodoraw conseguia
sentir aquele doce cheiro de amor...
Próximos do portal, duas figuras vinham na direção de
Jodoraw. Um deles era o rei amarelo, com sua túnica amarela e a sua máscara
branca, cobrindo o seu terrível rosto. Seus tentáculos e sua enorme cauda
possuíam escamas escuras,que brilhavam ao refletir a luz que emanava da grande
deusa Éris. Seu rosto era coberto por uma máscara branca pois ninguém podia
vê-lo, sua face poderia levar a loucura
àquele que o visse. Ele era descendente do terrível Cthulu, o último de sua
raça maldita.
A segunda figura , era uma mulher pálida,com um enorme saião
negro,com o seus seios brancos à mostra. Seus pulsos cortados jorravam o sangue
quente de seu corpo. Ela tocava uma harpa. As cordas de seu instrumento eram
feitas com as tripas de seu intestino,acoplado ao instrumento. Um véu escuro e
enorme cobria seu rosto. Ela caminhava lentamente , em direção a Jodoraw. Ao pé de seu ouvido ela lhe disse :
‘’a existência não vale pela quantidade de tempo que você viveu, mas pela sua
qualidade, morrer com o coração satisfeito é melhor que viver com a alma vazia,
viva o que você deve viver, não morra em vida trancafiado dentro de ti
mesmo,não transforme seu corpo em seu cárcere, morra vivendo o fluxo do rio que
és a tua vida.’’
E assim ela o beijou com seu véu negro que cobriam seus
lábios gélidos, entregou-lhe o cálice de Dionísio. Disse-lhe : ‘’beba neste
cálice sempre que esquecer quem você é ou quando te envenenarem com as mentiras
do grande ego. Lembre-se, esteja sempre atento aqui, nem ontem e nem amanhã,
apenas aqui, nunca ali e tampouco além. Escute a canção de Éris quando ela for
tocada em sua alma,apenas a escute.’’
Ao ouvir essa frase, sua arcada dentária se desprendeu de
sua mandíbula,voltando-se para o interior de sua boca mordendo sua língua com
violência, mastigando sua garganta,entrando pelo esôfago. Suas presas rasgaram com uma enorme violência
seu estômago , abrindo um buraco enorme em sua barriga. Seus órgãos despencaram
de seu abdome,caindo na sua frente pelo chão. Jodoraw não sentia dor, estava
com medo talvez fosse morrer naquele dia...
Sua glândula pineal lhe diz:
‘’Ame agora seu corpo,cada parte,cada órgão,cada célula que
faz com que sejas quem você...ame a si mesmo,até o fim. Eis o verdadeiro
amor...’’
Jodoraw entendendo a mensagem da grande pinha dourada,se
agaixou, deitou-se sobre seus órgãos espalhados pelo chão,se banhou naquela
poça de sangue alegremente,pegou suas vísceras quentes e começou a
acaricia-las. Cada toque era erótico, o prazer brotava da carne daqueles órgãos,pulsavam
e vibravam. Jodoraw beijava e lambia suas vísceras, estava fazendo amor com
suas partes internas. Estava trepando consigo mesmo. Ejaculou nas suas
vísceras. Seus órgãos também tiveram orgasmos,pulavam,latejavam,se moviam como
numa dança densa e caótica.
Jodoraw recolheu seus órgãos internos,colocando-os dentro de
si com carinho e respeito. Nunca havia sentido aquilo por si próprio. Ele agora
se amava.
Éris esguichou um líquido azul de sua vagina dourada,
tamanha a sua felicidade ao ver Jodoraw se amando. Ela arrotou para comemorar,
deu uma baforada daquele arroto em direção à Terra. O planeta começou a girar
ao contrário,uma nova era estava começando. A grande cidade de Aripiprazolandia
desabava com o impacto. O grande ego fora jogado para fora do planeta
azul,estava flutuando agora no espaço. Os novos homúnculos estavam bem,eles
iriam ser os protagonistas de um novo mundo que nascia,junto com as outras
espécies irmãs que ali habitavam...
O rei amarelo se aproximou de Jodoraw e lhe disse : ‘’Sua missão cósmica e caótica está completa
aqui,passe por aquele portal e viva uma nova vida . Não terás mais que voltar
para o lugar onde vivia. Agora vai retornar ao caos,existem outras realidades e
outros universos para você...’’
Jodoraw ultrapassou o portal do espelho e do outro lado ele
viu seu corpo de uma antiga vida caído no chão. Uma bala de uma arma havia lhe
estourado os miolos,sangue se espalhava por todo o piso. Um livro amarelo
estava ao lado de seu cadáver,as paredes do quarto estavam pintadas com
excremento. Ali haviam dizeres ocultos ,escritos com fezes. Nos dizeres podiam
ser lidos frases desconexas como : ‘’ Vou para a Carcosa, lá onde as estrelas
negras de Híades e Aldebarã brilham no céu. Do outro lado dos espelhos eu
encontrarei o emblema amarelo. Vou para Carcosa, próximo do lago Hali coberto
por sua neblina densa,onde os dois sóis brilham iluminando as duas torres. Lá
conhecerei Hastur e Alar.’’
Jodoraw pegou o livro amarelo,limpou o sangue da sua capa.
Jogou fora os medicamentos daquele homem morto,beijou-lhe a face e saiu daquela
casa. Uma nova vida o aguardava...andando com o vento batendo em seu rosto, ele
gostaria de saber onde estaria vivendo o escritor...atrás dele,a velha casa não
existia mais, página do conto já havia sido virada...
Éris segurava o emblema amarelo em sua mão...
O grande ego vagava pelo universo...
Lúcifer o humano, caminhava...
O antigo filósofo sonhava em seu barril velho,estava
embriagado de vinho...
O mais cínico de todos dormia ao lado de seus cães...
Sua lanterna estava apagada...
O escritor acreditava estar ficando louco naquele momento...
Não sabia se ele escrevia o texto ou se o texto escrevia
ele...
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